Opinião

No país da jabuticaba, um golpe à sua altura e que quase deu certo

Separe-se os idiotas dos radicais, porém sinceros, e dos responsáveis de fato pelo que aconteceu, punindo-se esses com extremo rigor

É correto chamar os golpistas do 8 de janeiro de idiotas e não de golpistas? Parte deles, sim. Poderiam não saber que iriam participar de uma tentativa de golpe de Estado para derrubar o governo. Estavam ali para expressar seu inconformismo com a derrota de Bolsonaro. O direito à manifestação é garantido.

Mas no país da jabuticaba, por pouco não deu certo o golpe que tinha tudo para dar errado. Era para que os órgãos de inteligência de dois governos, o federal e o distrital, soubessem o que se tramava. Foi anunciada nas redes sociais e em grupos de WhatsApp a operação que tinha como nome “Tomada do Poder”.

Era para que o acesso dos rebelados à Praça dos Três Poderes e, no limite, à Esplanada dos Ministérios, não tivesse sido permitido. Para isso, bastaria a presença da Polícia Militar disposta a proteger os prédios do Congresso, do Palácio do Planalto e do Supremo Tribunal Federal. Isso aconteceu uma semana antes, na posse.

Faltou polícia – o que se viu foi a presença decorativa de policiais, alguns a confraternizar com os invasores, outros a beber água de coco. Um carro da polícia escoltou os invasores até ao local aonde pretendiam chegar. A porta do Palácio do Planalto estava destrancada. A da Casa Branca e a do Kremlin nunca estão.

Os “Dragões da Independência”, unidade do Exército cuja missão é guarnecer as instalações da Presidência da República, saíram de folga ou foram dispensados. O Secretário de Segurança Pública do Distrito Federal antecipou as férias e voou para os Estados Unidos. Uma minuta do golpe foi apreendida em sua casa.

O governador Ibaneis Rocha (MDB), do Distrito Federal, não estava no melhor da sua forma. Só pelo celular respondia às mensagens de advertência de autoridades. E ao fazê-lo, limitava-se a repetir que a situação era de calma, reproduzindo os informes que recebia do Secretário de Segurança interino.

Ibaneis ganhou fama de governador de meio expediente, assim como Bolsonaro, que foi um presidente de meio expediente. Do meio da tarde em diante, quase nunca está disponível. Natural que nos fins de semana sua disponibilidade seja menor. Mas aquele seria um fim de semana mais do que especial.

 
O Comando Militar do Planalto sabia disso. O Comando do Exército, também. No acampamento montado à porta do QG do Exército, havia 300 pessoas que clamavam por uma intervenção militar (leia-se: golpe). Na sexta-feira, mais que o dobro. No sábado, milhares. E ônibus lotados chegavam a cada instante.

Não será difícil para as autoridades encarregadas das investigações sobre o golpe jabuticabeiro separar os idiotas dos radicais, porém sinceros; dos radicais ativos; e dos responsáveis direto pelo golpe. Esses, deverão ser punidos com extremo rigor, não importa que vistam farda ou que a escondam, ou que se trate de civis.

Inadmissível é que fique tudo por isso mesmo, ou que apenas alguns poucos paguem pelo que poderia ter posto a pique o período mais longo de democracia que o país já teve.

Ricardo Noblat é jornalista

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