Opinião

Sem caneta, Bolsonaro submete-se ao PL de Costa Neto

Bolsonaro repete itinerário da saída do PSL ao disputar verbas e comando

Valdemar Costa Neto e Jair Bolsonaro, do PL

Se pudesse, o ex-presidente Jair Bolsonaro deixaria o Partido Liberal e seguiria para outra legenda. Trocar de partido é muito comum em sua trajetória, já que estampou broches de oito siglas em seu paletó. Porém a organização do PL é bem diferente do PSL e Valdemar Costa Neto comanda o partido com mais habilidade que Luciano Bivar. Há as questões do fundo partidário e, sobretudo, falta a caneta na mão de Bolsonaro.

A votação da reforma tributária foi apenas a primeira faísca pública entre o bolsonarismo e o restante do partido. Apesar da pressão de Jair Bolsonaro, Valdemar se negou a fechar questão contra a reforma tributária, liberou os votos da bancada e 20 dos 99 deputados da sigla votaram com o governo. O vazamento de bate-boca em grupos de Whatsapp demonstrou que a fissura tende a se expandir a abismo entre as partes.

O Partido Liberal sempre foi de direita, mas jamais afeito a extremismos. Durante a campanha eleitoral parlamentares condenaram publicação de um documento que questionava a legitimidade das urnas, bandeira de Bolsonaro que alimentou sua inelegibilidade. O PL sempre compôs o centrão. Foi base parlamentar dos governos Lula e Dilma e comandou o Ministério dos Transportes nesse período. No governo Lula 3 tem o Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes ) para chamar de seu puxadinho. Gostaria de mais, mas o bolsonarismo estorva.

Convém lembrar da saída de Bolsonaro do PSL em novembro de 2019. O partido era um nanico até a chegada da onda de extrema-direita nas eleições de 2018. Teve um parlamentar eleito em 2014; 55 em 2018, tornando-se a segunda maior bancada na Câmara. O bolsonarismo, recém-chegado ao poder, acha que tinha direito de controlar a legenda. Bolsonaro até disse que Luciano Bivar, que comandava a sigla, estava “queimado”.

Mais do indicações de lideranças e votações a principal questão foi o dinheiro. R$ 110 milhões do fundo partidário em 2019. Bolsonaro queria controlar tudo. Bivar não deixou. Como tinha a caneta na mão e toda influência que a Presidência lhe agraciava, Jair e seus devotos abandonaram o barco com a promessa de fundar um partido que respeitasse as raízes da extrema-direita, o Aliança Brasil. O plano falhou.

E é novamente o dinheiro que azeda a relação entre bolsonarismo e PL. Entretanto, mais do que seu controle, sua falta. Sair do partido agora significa para Michelle e Jair abdicar dos salários que recebem, ao redor de 41 mil reais. Os deputados bolsonaristas têm que esperar a próxima janela partidária para trocar de sigla para carregarem suas verbas para outro rincão. Será um teste de fidelidade, já que MDB, União Brasil e outros tentarão contratá-los como se fossem jogadores de futebol. Acompanharão Bolsonaro ou aceitarão a proposta mais vantajosa? Com a influência do ex-presidente se esvaindo, a tendência é a fragmentação. E cada um cuide de sua vida.

Durante a pandemia, Bolsonaro repreendeu o general Mourão quando o vice afirmou que o governo federal compraria a vacina Coronavac. “A caneta Bic é minha”, estrilou. Meses depois trocou a Bic por uma Compactor, por tratar-se de uma empresa brasileira. Em 2023, sem caneta alguma, terá que submeter-se ao PL de Valdemar Costa Neto.

Ricardo Noblat

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