Opinião

E nós que pensávamos já ter visto tudo para eleger um presidente

O negócio de Jair está indo muito bem

Jair Bolsonaro rindo na frente do palácio do alvorada

Os antigos, entre os quais me incluo, ficaram chocados com a baixaria e o jogo sujo de Fernando Collor de Melo (PRN), em 1989, para derrotar Lula (PT) no segundo turno. Ambos se apresentavam como candidatos “contra tudo que está aí”.

O que estava ali era o governo de José Sarney, o vice que assumira o cargo porque o presidente eleito Tancredo Neves morreu depois de operado sete vezes. A primeira operação foi a poucas horas de ele tomar posse.

Sarney era um estranho no ninho do MDB, partido de Tancredo e dos mais reluzentes nomes do que se chamava Nova República. Bem que ele tentou domar a inflação legada pela ditadura militar, mas não conseguiu.

A esquerda e os pobres apoiavam Lula, como ocorre hoje. A direita e os ricos, Collor, ex-governador de Alagoas. A mídia apoiava Collor. Os dois chegaram praticamente empatados às vésperas das eleições, com Collor alguns pontinhos à frente.

Aí veio o primeiro golpe sujo: no programa de propaganda de Collor, apareceu uma enfermeira com a qual, quando solteiro, Lula tivera uma filha. Ela contou que Lula era racista e a favor do aborto. E que tentara convencê-la a abortar a filha.

Não havia redes sociais. Mas os programas políticos no rádio e na televisão tinham boa audiência. Aquela era uma eleição solteira, só para presidente, e a primeira desde a derrocada da ditadura que suprimiu a democracia a pretexto de salvá-la.

O golpe sujo abalou a campanha de Lula, mas uma secretária de um dos irmãos de Collor descobriu e revelou em entrevista que a fala da enfermeira fora encomendada por seu patrão. E que ela fora paga para enlamear a imagem de Lula.

 
Foi sob esse clima que Lula enfrentou Collor no último debate. Era unânime a opinião de que Lula havia vencido o primeiro debate. No segundo, ele não foi bem. Estava nervoso e parecia intimidado. Então, veio o segundo golpe consecutivo.

O Jornal Nacional fez uma edição do debate mostrando os piores momentos de Lula e os melhores de Collor. Foi numa sexta-feira. A eleição seria no domingo. O terceiro golpe foi aplicado no sábado: o desfecho do sequestro do empresário Abílio Diniz.

Diniz fora sequestrado no início daquela semana por quatro chilenos, dois argentinos, dois canadenses e um brasileiro ligados ao Movimento da Esquerda Revolucionária (MIR), do Chile. O valor do resgate era de 30 milhões de dólares.

O cativeiro foi localizado pela polícia com facilidade. Ficou cercado durante 36 horas à espera de que os sequestradores se rendessem. Como eles não se renderam, a polícia entrou, libertou o empresário e prendeu os criminosos.

Em seguida, na manhã do sábado, apresentou à imprensa camisetas do PT e material de campanha supostamente encontrados no imóvel invadido. A notícia foi publicada com destaque em todos os jornais do país no domingo da eleição.

Fechadas as urnas, anunciado os resultados, Collor derrotou Lula por 53,03% dos votos contra 46,97%. Governou por pouco mais de dois anos. Acusado de corrupção, foi deposto pelo Congresso mediante um processo de impeachment.

O Centrão, nascido em 1988, ainda engatinhava. Não havia Orçamento Secreto. Collor montou um esquema de compra de votos de deputados e senadores para evitar sua queda. Sobrou dinheiro e faltou quem concordasse em se vender.

Há, hoje, uma sala pequena e discreta no Palácio do Planalto onde um político muito conhecido recebe prefeitos em audiência que se dispõem a ajudar Bolsonaro a vencer. Os prefeitos são encaminhados por deputados e senadores.

Não entram pela porta principal do palácio. Seus nomes ficam com os plantonistas da guarita do estacionamento. Depois de rápidas conversas só para confirmar o acerto prévio de apoio, os prefeitos saem para os ministérios e de lá voltam satisfeitos às suas cidades.

Ricardo Noblat é jornalista

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